2 de agosto de 2012

REMOTO CONTROLE

A maneira como o projeto me foi apresentado já demonstrava uma postura extremamente profissional e responsável diante da proposta que ousava pensar uma interação entre os contextos artísticos de Natal e Curitiba. Apresentei a proposta aos integrantes do Coletivo, conversamos, debatemos e ficou claro o interesse de todos na participação desta plataforma. Seguimos o contato por meses, na organização dos materiais necessários para o envio do projeto, nos mal-entendidos da comunicação à distância, nas primeiras impressões sobre pessoas com as quais teceríamos mais tarde uma forte relação de performance e amizade. Aprender a viver juntos, à distância.

Depois do trabalho aprovado, produção. Um ritmo frenético de planejamentos e organização de horários, tabelas, cronogramas, idealização de lugares e pessoas que eles poderiam conhecer. Disse aos meninos do Coletivo, "podem deixar que eu organizo isso", a mesma mania de sempre. Eu, que antes era ponte entre curitibanos e natalenses, já durante a produção tratei de colocar todos no mesmo espaço, virtual.

Foto: Yuri Kotke



Passa BodeArte, passa crise no mestrado, passa nova performance, passa outra ponte. E chegamos finalmente, ao momento do primeiro toque. "Nossa como você é alto!" foi a primeira coisa que disse antes do abraço. Acredite, foi só o que consegui dizer. Eletrizada pela situação que se colocava e pela tensão de não deixar nada faltar, atrasar, incomodar. Tentativa de mostrar perfeitamente nosso espaço imperfeito. Foi uma semana intensa, totalmente diferente da maneira como tenho construído minha vida, mas exatamente do jeito que gostaria que fosse. Aprender a viver juntos, aqui.

Ele conheceu diversos artistas, eu percebi diversas maneiras de pensar a arte. Umas convergentes com as minhas, outras divergentes e até desprezadas por mim. É interessante perceber que na chegada do olhar estrangeiro, o que mais se modificou não foi nenhum dos lugares ou dinâmicas ou artistas tocados pelo seu olhar, mas o meu, o eu.

Nos momentos em que não sabíamos o que se poderia ou não falar, nos momentos em que o toque se intensificava e virava palavra (sim, não o contrário), ia percebendo que minha vida em performance se constrói na experiência, os pensamentos divergentes se resolvem no dividir de um movimento na areia. Na vontade de mostrar tudo sem conseguir esconder como violentava meu corpo.

Foto: Yuri Kotke


O tempo passava, ninguém sentia, apenas o cansaço nos denunciava no olhar. A vontade de viver todos os dias como se estivéssemos correndo de bugres nas dunas, juntos, a vontade de nunca deixar ninguém pensar a nossa performance fora do seu corpo, juntos, a vontade de expurgar toda a violência sofrida diariamente numa música do The Smiths, juntos, a vontade de não dar o último abraço. Aprender a viver juntos lá.

Lá se tornou aqui, por ainda menos tempo, com ainda mais ansiedade, com suas próprias pitadas de violência. Me preparei em performance para a minha chegada, pensando os contextos, escrevendo pequenos manifestos dentro do manifesto. Sempre pensando que lá seria ainda melhor. Como foi.

Performei, perante a olhos que pareciam facas tentando ultrapassar minha armadura de prata, que afastava com cada palavra e com cada FOME que tentava arrancar de minha garganta cansada. Brigando sempre com meu corpo, para parar a tremedeira de frio, de tensão, de doença que não me deixava chegar tomando remédios, gritando mais alto, aumentando a massa corporal de casacos que acoplava e que ainda faltavam.

Foto: Yuri Kotke


As críticas, de verdade e de mentira. Desde a mais sincera sugada de uma noite de bebedeira à mais superficial pela qual me sentiria invadida em outros momentos, que não o agora. Tão absurda que acabou presa naquele instante em que acordei do meu "happy place" sendo chamada por um nome que não era o meu. Vê, também sei escrever!

Medo. Detesto quando as pessoas me olham com medo. Eu estou bem aqui, já tirei a armadura, já perdi minha voz, já voltei a ser mais um. O lá já deixou de se aqui. Mas ainda está impresso, gravado, colado na minha ainda rouca voz, nos meus pés congelando no frio, nas minhas experiências com acontecimentos que não pertencem ao meu corpo. Aqui.

Aprender a viver juntos nem aqui nem lá. Descontrole Remoto.

"Nós acreditamos no humano, e com nossas ações esperamos 
promover mudanças que aliviem os egoísmos
 causados pelas dinâmicas atuais de vida e de morte."


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